Wednesday, April 23, 2008

Viajar pelo(s) espaço(s)



José Luís Peixoto, Adriana Lisboa e Mempo Giardinelli revelaram, ontem, a viagem “ a viagem ou a inquietude da solidão”, na mesa que encerrou o ciclo de conferências “Literatura em Viagem”, em Matosinhos.
A moderação ficou a cargo de Manuel Sobrinho Simões que, apesar de efectuar pesquisas relacionadas com cancro, foi convidado por gostar de ler e por se assumir um viajador, nem que seja em trabalho. E foi Sobrinho Simões quem começou a discussão ao dizer que “a morte das pessoas é a coisa mais espantosa que há”.


Mempo Giardinelli concorda com a afirmação e advoga que “na literatura, nós também trabalhamos com a morte”. O autor argentino confessou que se a literatura, designadamente a literatura centrada em viagem, se transformaram no refúgio. Giardinelli recordou momentos passados, que o acercam no presente, de viagem e deu-nos a perceber "a viagem e a literatura como impulsionamento “para recuperar o tempo perdido”. Foi então que se dedicou a viagem pela Argentina e tal encaminhar permitiu-lhe “conhecer uma Argentina mais profunda que era a que eu queria conhecer”, confessa o autor.
Adriana Lisboa consegue ver a solidão para além da inquietude, não tendo, para ela, uma coisa a ver com a outra até porque se “a solidão provoca inquietude, a mim nunca me provocou”, de acordo com a brasileira. Adriana referiu que o primeiro meio de transporte dela são os livros e, por isso, assevera que “as viagens reais e simbólicas têm se dado através dos livros”. No entanto, a escritora “ao contrário de viajar em busca das entidades ou países viajo para me sentir estrangeira”, na busca do diferente, e, nesse sentido, não pretende essa situação até porque “a vida é a aceitação do nosso mundo que não tem outra coisa a não ser transitória”, enfatiza. Nada poderá criar uma melhor imagem do que este facto que passo a enunciar: Adriana é brasileira, mora nos EUA e viu-se a escrever, em português, acerca de Quioto (Japão).



O luso José Luís Peixoto reflecte sob um outro prospecto até porque as obras dele não «diziam», supostamente, muito acerca da temática. Ainda assim, consegue resumir a ideia daquilo que pode ser exposto: “existem diversas formas de viajar, designadamente a viagem no tempo – a científica – como a viagem da idade – do ontem para amanha”, enuncia. A vida, para este autor, está envolta em nós e “os livros são compostos de uma matéria fundamental que é a vida”. A vida que também é o tempo, sendo “o tempo é aquilo que fazemos com ele” e “a nossa aprendizagem da própria vida do início até ao fim do qual não podemos fugir”, assevera o escritor com algum humor no decorrer da oratória.
“Escrever é um acto de solidão”, como diz José Luís Peixoto, “mesmo que num café ou num estádio, porque quando se escreve está-se sozinho e quando lemos também, mesmo em voz alta”. Este é o entendimento da viagem que, inclusive, Giardinelli admite ao explicar que a “solidão é um motor da angústia e a angustia é o motor da criação literária”. A inspiração que advém, porventura, da “ viagem interior [que] é a melhor viagem da literatura…a viagem do leitor” que ora foram e que lhes transmite a confiança da “maravilha de uma viagem na literatura [que] não é de ida. A maravilha é viajar”, diz o argentino. E não importa qual a direcção, se intensa ou mais vaga, quando “navegar é preciso”, cita o escritor.
Actos que sublinham o indivíduo e que se traduzem em características que vão envolver algum esforço compreendido por prazer e mudança, como nos enfatiza José Luís Peixoto.



Mais do que um reflexo no espelho, quatro pessoas marcaram a presença, em mais um ciclo da literatura, onde o que importa não é a entidade que sabe as respostas, mas a pessoas que as procuram, pois “há memórias que já não se sabe se são lidas ou vividas”, à luz de José Luís Peixoto, mas a lembrança das literaturas ou das viagens vai permanecer a cada página vindoura até ao próximo ano.




Anabela da Silva Maganinho



Aqui deixo duas citações que me parecem de relevar:


"A viagem é o tempo... é relativo, passa devagar… Temos um relógio, mas não serve de nada. Se acha que a vida passa depressa cometa um crime e va para a prisão e aí passa devagar.
"Há uma coisa que, para mim, é muito curiosa por textos que tenha escrito. Uma coisa com a qual sempre me debati foi o facto de, no sítio mais exótico, nunca conseguir ter um olhar que não fosse o olhar de uma pessoa [como eu]. Não conhecer mais ninguém por dentro a não ser a mim próprio". José Luís Peixoto

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