Wednesday, November 7, 2007

O “outro” lado do “homem”


Caetano Veloso esteve na Fundação de Serralves, no passado dia 14, para apresentar a nova obra literária “O mundo não é chato”, composto por textos de 1961 a 2005 escritos para media, discos, conferências e inéditos.
O músico brasileiro regressou a Portugal para dois concertos nos Coliseus de Lisboa e do Porto e passou por Serralves para falar nos temas que acercam a sua vida: música, cinema, literatura, teatro, política e, o Brasil.
“Um disco pode ser como um ensaio”; não obstante, Caetano Veloso atenta no facto de que, “muitas vezes, pensam nos meus discos e nos meus espectáculos como se fossem filmes, mas o único filme que fiz chama-se «Filme de ensaios», o cinema falado. Os discos e os espectáculos têm uma “característica de estruturas, como se fossem maiores do que a soma das partes que a compõe, assim como o filme é”, esclarece.
Assume-se um “homem cordial que veio para a democracia racial que se opõe aos mitos”, Caetano Veloso revela que “está errado”: “as raízes dos Estados Unidos têm que ser negro-africanas” e isso é “resultado que vem dos senhores brancos que disseram «se for filho de preto é preto e sai para lá; sai para o lado de lá para não sujar aqui. Compraram isso e querem nos vender”. Caetano advoga “eu não vou comprar, eu sou brasileiro”.
Caetano considera que o mundo pode ser transformado, pode ser refeito e é isso que “desejo fazer, «vamos refazer o mundo».
Aos 26 anos, o cantor foi preso juntamente com Gilberto Gil, tendo, no ano seguinte, em 1969, seguido para o exílio e se fixado em Londres.
A canção popular surge dois anos antes; porém, hoje confessa que tudo lhe interessa, mas não é suficientemente estimulante, aliás “gosto mais de ler (especialmente prosa) do que de ouvir música”. “Eu gosto das canções, da história das canções; contudo, não fico a ouvir música o tempo todo; prefiro ler (…). Não tinha a intenção de passar a vida a compor e a cantar, simplesmente aconteceu”, revela o músico. Caetano Veloso salienta que “ isso colocou-se na minha vida e, como ela me atrai, me estimula, eu gosto e sou capaz de fazer razoavelmente, tomou conta de mim”. Por sua vez, a poesia, para que consiga conceber, “tenho que fazer um movimento para fora, para ficar noutra posição (…); todavia, não acho que haja um valor necessário maior na poesia do que na música popular”.
Em Portugal, a opinião que o músico emite é que este integra “uma parte que a Europa olhava com uma certa relativização acerca do seu europeísmo”: “é uma Europa peculiar pelo facto de compartilhar a cultura popular brasileira através da música popular e das novelas de televisão”.
Caetano Veloso relaciona a ligação cada vez mais próxima entre Portugal e Brasil com a consequência: “quando Portugal cresce por causa de ser parte da União Europeia, as novelas da Globo, Chico Buarque, Caetano… tudo cresce. E essa confusão traduz esse amadorismo racial dos portugueses.
No que concerne ao acordo ortográfico muito em voga nas comunidades e lusos “pode vir e não ligarmos”, assegura Caetano que assevera ser contra e que pensa que nos “devíamos unir mais na prática para não depender mais dessas convenções arbitrárias que acabam por ser um pouco injustas e inócuas”.
O Brasil é um país que, segundo a sua concepção, reúne “nações continentais; do hemisfério sul; na América; tem a maior população negra fora do Continente Africano; é, talvez, o país mais altamente miscigenado racialmente do mundo e fala português”, ou seja, para Caetano arrecada um “acordo de desvantagens tão impressionante que tem que significar uma espécie de bênção”.
Bush também não foge às críticas do músico que diz que “é impossível ser mais incompetente que Bush e a sua equipa” e acrescenta “é impressionante, nunca vi. O problema de Bush não é a ideologia, é a burrice”.
Caetano Veloso revela na “terra” o “Cê” sobre “qualquer coisa” que, para ele, pode ser “muito mais”.

Anabela da Silva Maganinho

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