Monday, October 15, 2007

Estrela a estrela no guião da vida


Mário Augusto é um jornalista de renome tanto a nível nacional como internacional. O seu percurso profissional começou pelos jornais e pelas estações radiofónicas até que rumou ao serviço público de televisão. Foi na RTP que se deu a conhecer a imagem de Mário que catapultou para a SIC, a primeira estação televisiva privada.
A SIC estava a dar os passos cimeiros para a sua fundação quando Mário decidiu apontar a sua carreira na estação de Carnaxide. A partir daí foi só trabalho após trabalho e país atrás de país pelos “Bastidores de Hollywood”.
Pois é assim, justamente, que se intitula a estreia em escritos de Mário Augusto, estávamos no ano de 2005. Um livro que não imaginava qual seria a aceitação, nem sequer lhe passava pela cabeça um continuar. É certo que a primeira edição fez-se esgotar e outras mais se lhe seguiram, vendas que rondam os milhares de exemplares.
Dois anos depois, Mário decide publicar “Mais Bastidores de Hollywood” e, no prefácio, confessa que foi “surpreendido pelo elevado número de emails de leitores curiosos, especialmente jovens, atentos cinéfilos que me incentivaram a continuar na escrita destas pequenas histórias de Hollywood e das estrelas do cinema”.
Um trabalho acercado pelo rigor de uma pesquisa continuada e, por isso, “mais do que jornalista fui curioso leitor” e revela que “acabou por me dar um enorme prazer”. Não fosse este jornalista enveredar pelo caminho das estrelas e transformar-se no personagem principal na película do DVD que acompanha o livro. Um livro que mostra o “Sorriso da Rita”. “O Sorriso da Rita” é uma hiperligação da Associação Portuguesa de Doentes com Paralisia Cerebral para a qual são revertidos todos os lucros dos direitos de autor de Mário Augusto.
Porque “a vida com paralisia cerebral é como um filme: tem acção, comédia, emoção (…) e aprendemos com os próprios enganos”, de acordo com Mário.
Um jornalista de profissão que não deixa de ser homem e dedicar o tempo à sua família, sobretudo, à sua filha Rita.
Mário esteve presente no ISLA, de Vila Nova de Gaia, como convidado para a segunda edição das Jornadas de Comunicação Social e falou-nos um pouco acerca da sua experiência não só pelos filmes de Hollywood, mas, essencialmente, pela longa-metragem da sua vida.

Anabela (A) – Como é que um jornalista consegue conjugar de tal forma a vida profissional com a vida pessoal?
Mário Augusto (MA) – Não. Depende do jornalismo, se forem os dois de guerra é capaz de pôr a família com o coração nas mãos. (risos) Vou muitas vezes para fora, mas vou menos vezes do que aquelas que parece. Por exemplo, vou agora para Los Angeles e vou lá ficar uma semana, mas são casos excepcionais, porque vou, não raras vezes, a Londres e venho à noite ou apenas fico de um dia para o outro. A única chatice que o jornalismo tem é que andamos sempre com o gravador ligado. Não dá para chegar a casa e desmontar cassete. A verdade é que anda sempre na cabeça alguma coisa a fermentar.

A – É que, normalmente, incutem-nos que há horários para entrar, mas não há para chegar a casa?
MA – Isso não é verdade. Podemos trabalhar aos fins-de-semana, mas os funcionários de caixa do Continente também o fazem.


A – E quando vai de férias, concorda com a afirmação de Daniel Catalão, justamente acerca disso “que o jornalista vai de férias, mas continua a trabalhar”.
MA – Foi o que eu disse agora no final. Não me considero um jornalista “hard news” como eles [Daniel Catalão e Jorge Oliveira – RTPN] estavam a falar. Faço muitas outras coisas em Comunicação: escrevo argumentos, desenvolvo projectos de programas e isso faz com que eu ande sempre com as coisas na cabeça. Não gosto muito de férias na praia; porém, a família toda gosta e vou. Fico a trabalhar no computador ou a ler. O que não sinto é a necessidade de acção, penso que [a afirmação] é um pouco folclore.

A – Embora trabalhe em outras áreas da Comunicação, escolheu ou é destacado pelo jornalismo na especialidade do cinema. É uma área que o fascina, mas porquê? Foi algo que surgiu ou um investimento da sua parte?
MA – Aconteceu quase por acaso. Sempre achei muita piada ao mundo da televisão, desde miúdo. Todavia, não foi nada premeditado, com a intenção de fazer isto para fazer televisão ou para ser jornalista. Na altura em que cresci, o jornalismo tinha um encanto. O próprio nome da profissão – jornalista – tinha um encanto que fascinava. Actualmente, as coisas foram acontecendo por acaso, e pela razão que evoquei no início. Nunca me levei a sério a fazer as coisas. Faço o que posso, o melhor que posso e faço-o é com seriedade. As coisas foram surgindo. É obvio que os tempos são outros e as coisas são muito diferentes do que quando eu comecei. A concorrência e a competição entre colegas são muito maiores, há muito mais mão-de-obra facilitada e barata, as especializações são muito mais difíceis, enfim… mas fui fazendo, e foi sempre pelo cinema que me diverti. Foi, inclusive, pelo cinema que comecei a fazer coisas na Rádio e entrei no mundo da Televisão. O jornalismo de entretenimento vai quase colateralmente e foi uma consequência.

A – Como aborda jornalismo actual, na sequência do que falou?
MA – Acho que está em grande mutação. Estes jovens, recém-licenciados, têm que encontrar os seus próprios espaços e especializarem-se em determinadas áreas, porque o jornalismo já não é Rádio, Televisão e Imprensa, são mil e uma subsecções que vão desde a Internet à Comunicação Empresarial e aos press releases. Há mil e uma formas de fazer comunicação. Jornalismo já não é o jornalismo como nós entendíamos há meia dúzia de anos. Estamos perante uma profissão que é comunicar e o jornalismo está dentro desse saco – a comunicação. A ideia que conheço do jornalismo era o homem que contava as histórias. Aliás press vem de pressão e, para os ingleses, press é o jornalismo. Era uma forma de contar, relatar, questionar. Agora é tudo muito diferente. Há 30 anos atrás o apresentador de notícias não era um jornalista, era um apresentador; agora é o jornalista. Falta, de facto, saber quem é o jornalista? Ele só está ali a ler as notícias: só lê os pivots e lança as notícias, será que isso é jornalismo? Tudo isto é muito discutível. É comunicar essencialmente. Por isso é que agora os cursos se chamam de comunicação e não só jornalismo.

A – O podcast e os blogs são formas que estão a inverter a tendência do jornalismo tradicional. Acha que isso poderá acabar com a Rádio, a Televisão e a Imprensa?
MA – Isso preocupa-me um pouco. Já não sou dessa geração e tenho alguma dificuldade em perceber as mensagens que o meu filho me manda, porque aquilo é tudo por siglas, meias palavras, palavras mal escritas... Mas acho que um dos futuros passa por aí. Tem é que se filtrar tudo muito bem. As Rádio piratas quando surgiram era qualquer “gato pingado” que fazia uma Rádio lá na rua. Foram correndo e subsistindo somente aquelas que tinham: ou um suporte financeiro por detrás ou um projecto válido.

A – Portanto, levará a um abalo, mas não há extinção?
MA – Não. Acho que vai tudo mudar com o tempo.

Com tantos anos de profissionalismo as vicissitudes e os entraves atravessaram-se na sua vida. No entanto, nada o desmotivou de prosseguir com os seus objectivos que, ao invés, ainda o fortaleceram e lhe deram vontade de continuar.
Quando falamos em superação profissional, Mário confessa que foi ter de escrever o primeiro livro: “o primeiro livro doeu muito a fazer, porque como sou jornalista de televisão a escrita em papel é completamente diferente. São regras diferentes, há cuidados diferentes na mensagem, há formas e fórmulas distintas para fazer passar a informação que se pretende. Estou habituado ao tratamento da imagem, numa composição entre o jogo de fórmula. No papel não, as coisas não se processam de igual modo. E foi, para mim, uma superação ter de encontrar um estilo de escrita, para poder por no papel de forma a que as pessoas se aperceberem do que eu queria dizer e fossem de encontro à minha ideia”.
No fundo a ideia é que as imagens fossem criadas, tal como se formula em Rádio “é o truque que se encontra e que eu tentei apurar – penso que consegui em parte”. Na análise profissional Mário assume que a maior superação foi, efectivamente, fazer estas coisas. “Não tirei curso superior, como é que eu cheguei aqui?!” é a questão que circunscreve o seu raciocínio, por vezes, e daí conclui que “só cheguei por essa razão especial. Nunca procurei fazer isto, por fazer isto. Procurei fazer por me interessar, para me dar gozo e, a posteriori, conseguir cativar as pessoas a quem tinha de fazer passar a mensagem, que são os espectadores”, assevera Mário.

A – No ano passado, o jornalista entrevistado foi Pedro Cruz, ao qual perguntei “o que era para ele o jornalismo?” Ele retorquiu dizendo que o jornalismo “é um estado de espírito e não uma profissão”. Concorda com essa afirmação?
MA – Eu, se calhar, aos 30 anos também dizia isso. Não, é assim: todas as profissões têm o lado fantástico e de prazer que dá às pessoas que a exercem. O jornalismo tem uma particularidade – é comunicação, é falar aos outros, é passar a mensagem uns aos outros – e isso dá-nos, por um lado, uma sensação de poder – que realmente não existe – e dá-nos o prazer de “nos ouvirmos” ou de “nos vermos” ou de “nos lermos”. Mas devo dizer uma coisa engraçada. Uma das primeiras peças que escrevi em jornalismo foram num jornal de Espinho – o “Espinho Vareiro” – julgo eu que já não existe. A sensação que tive da primeira vez que fui à arca buscar um texto escrito por mim – isto do ano de 1981 – foi uma sensação que nunca mais experimentei, que nunca mais tive da mesma forma. Portanto, se calhar ele quando diz “estado de espírito” é poesia. Faça-se o trabalho com paixão, seja ele qual for esse estado de espírito vem agarrado.

Uma carreira cuja longevidade supera muitos trabalhos e conquistas, mas que envolve várias viagens um pouco por todo o mundo. Quer dizer todo o mundo “mais ou menos”, segundo Mário, “O mundo civilizado, porque nunca fui para as guerras”.
O manifesto de maior fascínio foi em Los Angeles: “Quando cheguei a Hollywood e vi as letras, o passeio da fama… – isso também em 90 – foi a sensação de entrar num bilhete-postal, de entrar num sítio que, realmente, nos espanta”. Decepção nunca teve a sério; contudo, “houve um sítio onde não me senti tão bem”. Não obstante, relativiza alguns momentos, “uma vez que as viagens, o prazer das viagens não está no momento da viagem, está na digestão da viagem”, declara e continua “depois de sairmos dos sítios ao relembrar-nos deles e ao reviver as situações, é o gozo maior que as viagens têm e, como tal, somos selectivos. A recordar, a memória da viagem vamos apagando as coisas que são menos simpáticas”.
Um percurso que passa por um número incalculável de projecto; todavia, o programa de Mário é emitido na SIC Notícias. Falo de “35mm”.

A – “35mm” é o programa de mérito e reconhecimento por tantos anos de profissionalismo ou mais uma actividade profissional?
MA – É mais uma actividade profissional. Ou melhor, é a minha actividade principal. O Dr. Balsemão ao pagar-me para fazer o trabalho sabe que também a SIC tem um retorno de notoriedade. Contam com uma pessoa especializada em cinema americano e que faz aquilo. Digo isto sem falsas modéstias. Digo-o hoje, daqui por dois ou três anos pode ser um outro qualquer e ninguém me reconhecer como tal. Não o entendo como reconhecimento, é um trabalho que me dá muito prazer fazer.

A – Qual a sua maior virtude enquanto jornalista?
MA – Seriedade no trabalho que faço.

A – Saiu da RTP há 15 anos e rumou à SIC com “vontade de inovar”. O que leva um jornalista a inovar?
MA – Pragmatismo acima de tudo. Saí da RTP por um projecto novo. Eu tinha na altura 28anos, estava a começar a lançar a minha carreira a sério, muito embora na RTP já tivesse feito muitas coisas (apresentação, programas, até programas infantis fiz e rubricas de cinema). Todavia, as condições que me ofereceram na SIC eram extremamente vantajosas e eu sabia que estava a trabalhar com um grupo de pessoas de quem eu gostava muito. Estávamos a começar uma coisa do zero – acho que a SIC é um projecto vencedor – e o prazer de dizer que estava lá no início, aquando da primeira pedra; eu estava ali a empurrar o barco quando ele arrancou, é fantástico. É uma experiência de memória muito interessante. O que não quer dizer que eu vá morrer na SIC. Posso daqui por uns meses, daqui por um ano ou por dez cansar-me da SIC e aquela SIC já não me dizer nada. Mas estive lá na primeira hora, assim como estive na primeira hora de algumas coisas na Rádio Nova, como ajudei a algumas coisas na RTP. A boa memória do arranque da SIC faz parte da minha biografia.

A – O que não quer dizer que a RTP não tenha correspondido às suas expectativas?
MA – Não, de todo. A RTP continua a ser, para mim, a minha casa mãe. Foi lá que aprendi a fazer televisão, foi lá que tirei cursos, é lá que tenho grandes amigos. Ainda hoje vou frequentemente à RTP, visitá-los, conversar, tomar café e ver as coisas. Aliás na RTP era colaborador, há nove anos que era colaborador, não integrava os quadros. Talvez isso também tenha pesado na minha ida para a SIC. Agora penso que ainda bem que a RTP não me colocou nos quadros, poderia lá ter ficado e hoje andava a fazer umas coisas. Na SIC tive outro tipo de oportunidades, embora continue a ter pela RTP um carinho muito especial, sem dúvida.

O cinema é uma das grandes paixões de Mário Augusto. O que o fascina no cinema e na fábrica por onde as estrelas partem é “essencialmente a forma de transmitir emoções e sentimentos e a forma de contar uma história”. Para este jornalista “o que o cinema tem de mágico é que consegue estabelecer pontes com as nossas realidades, sejam elas mais dramáticas, menos dramáticas, mais comédia romântica, menos até o cinema fantástico faz pontes com as nossas realidades. O cinema tem me ensinado quase tudo. Tudo o que eu sei de comunicar é o cinema que me ensina e é por isso que continuo a gostar muito de cinema. Continuo a ser um espectador de cinema muito atento e muito entusiasmado”, admite.

A – Se pudesse escolher uma cena de um filme qual seria a mais meritória para si?
MA – É muito difícil escolher a cena de um filme, assim como é difícil escolher um filme “qual o filme da sua vida?!”. Não há um filme da minha vida, há os filmes da minha vida. Porque tem a ver com quem estava a ver o filme, com o estado de espírito da época, se estava a chover ou não estava, se estava sol… há mil e uma razões para se amar mais um filme ou menos, mas se tivesse que escolher uma cena, escolhia duas: a parte final do filme “Casablanca” e o “ET”, a cena do ET com o miúdo, que me tocou na altura que via era miúdo e continua a fazê-lo, que é um ciclo de amizade muito bonito.

A – E esses são os filmes que realmente o apaixonam ou outros fazem parte da filmografia?
MA – Ambos fazem parte dos meus filmes favoritos; não obstante a existirem muitos outros. Há medida que vamos evoluindo, vamos crescendo até intelectualmente, vamos criando outras prateleiras para outros filmes. Um dos filmes que mais me entusiasmou recentemente foi o Babel. O “Magnólia”, do Paul Thomas Anderson, filmes fantásticos; “os Indiana Jones”, acho aquilo delirante, delicioso. O “Era uma vez na América”é um filme que eu gosto muito; o “Citizen Kane”. Enfim, há mil e um filmes. Em casa tem mil filmes em DVD, se calhar desses 1000 destacaria 600, com filmes que vejo e revejo.

Tantos filmes, inúmeras estrelas que marcam as suas pisadas por entre passeio da fama e restantes passadeiras vermelhas. Um espectáculo de luz com ou sem efeitos especiais que asseguram uma entrevista com Mário Augusto.
Se pudesse escolher uma actriz que desfilasse “de braço dado pela passadeira vermelha, seria a Monica Bellucci”. É sobre esta artista que recai a escolha de Mário; apesar de para conversa eleger Clint Eastwood “que curiosamente nunca entrevistei, já estive com ele em várias situações, mas nunca o entrevistei”. Um pouco triste Mário pensa que está a “ perder a oportunidade de o entrevistar pois ele está a ficar velhote. Mas é um actor e um realizador fantástico. É daquele grupo dos que têm tanta coisa para contar que não se importam de estar ali horas e horas a partilhar”.
E por falar em entrevistas a mais hilariante que Mário realizou foi a Robin Williams. “Completamente passado dos carretos. Muito muito divertido”, lembra Mário por entre sorrisos.
Por entre projectos distintos Mário afirma que não espera alcançar nada: “espero cumprir-me todos os dias à medida que vou fazendo coisas”. Continuar a fazê-las e cada vez melhor, cada vez com mais entusiasmo, o que é difícil”. Mário Augusto patenteia que “há medida que a pessoa vai envelhecendo – começa a ficar velho do Restelo – começamos a achar que os mais novos não sei quê, começa ali a criar uma série de anticorpos em relação à constante evolução”. Auto-define-se como “uma pessoa sempre cheia de projectos, sempre cheia de ideias”. Porém, a concretização nem sempre é conseguida: “não me importo nada que esses projectos vão morrendo à medida que, mal crescem morrem logo e, nessa sequência, nem chegam a vir à luz do dia; já outros vão subsistindo. Gosto de ter muitos projectos e essencialmente quero cumprir, estar permanentemente a evoluir e a sentir-me bem comigo próprio”, arroga.
Um Óscar não era suficiente para toda a carreira deste jornalista, mas poderia ser atribuído a Mário aquele que ele gostaria de receber – o Óscar de Realização.
“Adoro cinema pelo lado de trás da câmara. Acho uma coisa verdadeiramente fascinante”, revela este homem que concilia tudo na sua vida e vê a sua existência defronte para com a realidade. Por isso mesmo, considera não ser fácil ganhar o Óscar desejado “nem será possível nesta minha vida, porque já estou a ficar velhote para estas coisas”.
Um vencedor já é ele com “o sorriso” que lhe resplandece a vida, conduzindo-o pelas estrelas cintilantes num percurso dourado pelo espectáculo audiovisual

Mário Augusto e a filha Rita: os protagonistas

Anabela da Silva Maganinho


Uma companhia de qualidade

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