Monday, December 24, 2007

Uma década ao ritmo da música


Bruno, AJ, Jorge


Os Blunder regressaram aos showcases no mês corrente, nas lojas Fnac do Porto, nas quais estiveram a promover o álbum mais recente “Pawn” e a divulgar algumas das iniciativas que apadrinham.
A banda liderada por AJ Santos surgiu no ano de 1998 com o EP de estreia “Naif”. Os Blunder começavam a ser conhecidos no panorama nacional, sobretudo, com a vitória alcançado num concurso de bandas nacional.
O projecto Blunder, como todos os projectos, “são criados primeiro no imaginário”, assevera AJ e continua “nós pensamos no projecto Blunder quando ainda tínhamos outras bandas, outros projectos, e foi possível pôr em prática com uma formação que era diferente da que temos agora”.
AJ Santos, na guitarra e na voz, Jorge e Bruno Oliveira a cargo do baixo e da bateria, respectivamente, integram a actual formação da banda que ficou conhecida com a música “Blister in the sun”.
Subsequentemente ao registo de 2000, a banda foi premiada com o título de “best new act” e “best vídeo” por algumas das mais influentes revistas portuguesas. No entanto, os rapazes não se ficam pelo nosso país e decidiram dar o seu contributo ao panorama internacional. Os videoclips dos Blunder rodaram nas grandes estações televisivas especializadas e conseguiram boa cotação entre o público.
Em 2005, os Blunder decidiram criar um disco dissemelhante “Pawn”, com formato «branco» (2006) e «preto» (2007), ambos licenciados no Reino Unido. Um álbum que continua a dar frutos, nomeadamente pela inserção do tema “Aka everything she wants” na série televisiva “Morangos com Açúcar”. Não obstante, os Blunder encontram-se repartidos por duas iniciativas de culto da música nacional que são o Arena Rock e o projecto A Cause.

O primeiro andar

“Tocamos pela primeira vez, em 1998, na Fnac do Norteshopping”.

Anabela (A) – Sabemos que os Blunder apareceram no panorama da música nacional há quase dez anos, mas como é que se encetou o processo de formação da banda?
AJ – Os Blunder eram compostos por cinco pessoas. Sou o único elemento remanescente da formação inicial e foi, de certa forma, comigo que surgiu a banda e continuo a carregar o estigma do projecto. Em 1998, conseguimos tornar possível o projecto Blunder da forma como é, com os temas e com o género musical com que se apresenta.

A – Estamos, então, a falar de um projecto planeado que não deixou de ser o embarcar numa aventura?
AJ – Foi a junção de um conjunto de amigos que não tocavam juntos, mas que já pensavam em ter um projecto com determinada sonoridade e com determinado objectivo. Num ano conseguimos assinar contrato e gravar o disco que ansiávamos. Portanto, não foi feito em laboratório; porém, foi pensado antes de ser posto em prática.

A – Em muitas pessoas pode ainda suscitar curiosidade de porquê o nome Blunder?
AJ – Era mais um projecto. Mais um risco que podia ser um grande erro, mas não foi felizmente. O nome ficou por que o fonema era interessante e prevaleceu.

O frente-a-frente com o público

“Quando pensamos no primeiro concerto suscita-nos alguma nostalgia. Temos gravado em vídeo e até podemos vir a mostrar ou a editar isso em algum dvd”.

A – Lembram-se do primeiro concerto que realizaram? Como correu?
AJ – Tenho ideia. O primeiro concerto foi em Maio de 1998, em São Pedro do Sul. Lembro-me de ter sido trabalhado para ser uma primeira mostra, na qual as pessoas pudessem estar a testemunhar. Realmente marcante é como caracterizo esse concerto, porque foi a primeira vez que nos deslocamos. Fomos com um grande staff, com carrinhas e com material para uma terra que não era a nossa.

A – E da primeira vez que a vossa música tocou nas rádios, qual foi a sensação?
AJ – A primeira vez que ouvimos o nosso tema na rádio foi numa rádio local, mas já não tenho tão presente. Tenho mais ou menos ideia de uma determinada maqueta que tocou em determinados spots; no entanto, não tenho tão presente como o primeiro concerto.

Ao longo de uma década

“Para o ano estamos a fazer dez anos, mas parece que estamos nos primeiros três”.

A – Com quase uma década de existência, qual é o balanço que fazem?
AJ – O balanço é sempre positivo, porque consegues sempre chegar a pontos que não conseguirias se não tivesses tido um projecto. É um projecto que tem três discos, muitas compilações, tem determinado número de acções com os media; portanto, foi um projecto de certa forma exposto. Não me arrependo de nada que, eventualmente, tenhamos feito no percurso da carreira: mesmo que não tenham sido as melhores apostas, pelo menos foram as que nos permitiram chegar até aqui e ter o núcleo de fãs, simpatizantes e de conhecedores da nossa música. É assim, pensar em dez anos para nós sintetizando isto tudo foi tudo muito rápido. Parece que o projecto ainda agora estava a começar a acontecer e já se passaram dez anos.

A – Com as dificuldades que a indústria musical atravessa, como é que se mantém uma banda com esta longevidade? Há algum segredo?
AJ – Nenhum de nós depende, única e exclusivamente da música, pelo que se assim não fosse, considero que poderia deparar-se com problemas sócio-económicos. Todos temos actividades paralelas e isso permite-nos levar isto como uma ocupação de tempo livre, que nos dá muito gozo, e que fará com que, possivelmente, continuemos cá, nos próximos 30 anos, com a mesma vontade e com muito empenho.
A – Acarretas o projecto Blunder desde a iniciação deverás ter mais em mente as mutações da banda. O que é que mudou, designadamente na sonoridade e na própria banda?
AJ – As coisas mudam naturalmente. O que vais ouvindo, que são as influências backgroung, despoleta o que já gostavas e queres pôr em prática, ao tocar. O primeiro álbum Blunder, talvez tenha sido mais comercial por imposição da editora. Neste momento, damo-nos ao luxo de fazer aquilo que queremos.

A – Qual é para ti a maior dificuldade em manter uma banda?
AJ – Não vou falar na dificuldade, vou para o outro extremo. Penso que o mais importante é que as pessoas se dêem bem, no sentido de que prevaleça a amizade que transcende o espectro de trabalho. Não sentir a obrigação de ter de estar na sala de ensaios a uma certa hora, para lá estar determinado tempo a tocar, por que o mais importante é sentirmos que nos vamos juntar. Nos nossos concertos as pessoas conseguem aperceber-se que estamos à vontade e que gostamos de estar juntos. Somos capazes de sair de um espectáculo e irmos jantar para estarmos a confraternizar. Esse é o segredo da longevidade. O mais difícil é conjugar personalidades. No nosso caso chegamos a um ponto de equilíbrio, no qual nos complementamos. Todas as ideias vão para cima da mesa, de forma a serem equacionadas e chegamos sempre a um ponto de entendimento.

Uma pausa, não o desaparecimento

“Por vezes, o facto de tocares muito, ou de quereres tocar muito, acaba por levar ao minimalismo. Atinges aquilo que queres realmente mostrar, aquilo que queres realmente fazer, e cinges-te a isso sem teres que dar mais para mostrares que é isto que sabes”.

A – Houve um período em que os Blunder estiveram um pouco mais afastados das áreas de promoção. Existe uma razão para o sucedido?
AJ – Teve como causa vários factores. As vidas sociais, as outras ocupações, … alguns de nós já constituíram família e isso faz com que haja dispersão. O projecto Blunder não é levado, às vezes, como o objectivo prioritário. Quando há um disco para lançar ou uma digressão para realizar existem targets e timings que são específicos. No entanto, quando estamos a levar por levar o projecto, surgem outras coisas que são consideradas de maior prioridade. A consequência é a banda ser levada para segundo plano, mas sem qualquer tipo de descrédito, uma vez que aquando de uma maior disponibilidade nos agarramos mais.

A “arena” das “causas” da música

“Nesta altura, o facto de estarmos a apadrinhar traduz-se em estarmos a tornar possível a iniciativa, não obstante, a permitir também a mostra de outros projectos e engrandecer o cenário musical português”.

A – O Arena Rock é um dos projectos que os Blunder não deixaram de apadrinhar. O que é que essa iniciativa significa para vocês?
AJ – No início, como é normal em qualquer banda, também nós passamos pela fase de concursos. Tentávamos mostrar o espectro musical e o potencial da banda. Não raras vezes, aparecem projectos como estreantes; porém, têm um potencial enorme e podem vir a ser algo de representativo no cenário musical português. Portanto, considero que é importante e, quando nos pediram, aceitamos dar o nosso contributo sem qualquer outro interesse inerente. É óbvio que está sempre patente a exposição do nosso projecto também, mas, acima de tudo, o que nos move é tornarmos possível a iniciativa.

A – Ainda no que concerne a projectos, dão a voz a um outro propósito que se intitula “A Cause”. Uma iniciativa diferente daquilo que se vê no nosso país; contudo, que se tem destacado pela sensibilização dos músicos e até mesmo do público. Como é que vêm essa inserção de bandas, nomeadamente do Norte do País, em prol de um objectivo?
AJ – O projecto A Cause surgiu numa conversa de café com o José Araújo – locutor da Rádio Comercial –, na tentativa de se fazer algo que nunca tivesse sido conseguido em terras lusas. Um “We Are The World” à portuguesa era o que pretendíamos. Por outras palavras, queríamos reunir vários músicos num plano em que pudéssemos ajudar, atribuindo todos os lucros do disco a uma instituição. Em Portugal, existem muitas iniciativas; todavia, estão disfarçadas e revertem 10% ou 15%, tendo em mente o lucro que irá provir para a própria entidade. O nosso caso foi de entrega total. Continuo a ter o projecto A Cause com o José Araújo e temos ideias de fazer reverter os lucros para outras instituições, conduzidos pelo mesmo propósito. Pretendemos organizar outras iniciativas com músicos, que são pessoas que estão bem, vivem bem estão felizes e têm meios. Por que não pegar um pouco na felicidade deles e entregar aos outros? O projecto “A Cause” prevalece. Foi um sucesso na primeira tentativa e há-de continuar. Acredito que se não for um exemplo ao menos pode servir de mostra como espelho para aquilo que se deva fazer.

O plano dos hemisférios

“Neste momento temos projectos com plano A e plano B para que, no caso de um não resultar, saibamos fazer uma aplicação prática da outra versão”.

A – Por falar em bandas nacionais, como é que vês o panorama da música contemporâneo, quer ao nível nacional quer internacional?
AJ – O mercado está mau. Não se vendem discos, está toda a gente, porventura, com o dado adquirido que pode encontrar tudo na Internet sem qualquer custo. O resultado é que as pessoas cada vez gravam menos, as editoras cada vez menos têm dinheiro para investir em promoção e penso que, nesta fase, não se pode adivinhar nada, porque ninguém sabe o que vai acontecer. Estamos a jogar um pouco sobre a bitola daquilo que era, a ver o que vai acontecer, para que nos consigamos situar. Em Portugal, a qualidade têm crescido muito: é gradual que se faz mais e melhor música. No campo internacional passa-se o mesmo o que faz com que haja ainda mais concorrência; no entanto, não estou preocupado com isso. Considero que cada um tem o seu espaço, tem é que ser original e saber-se placar ao mercado.

A – Como está a correr a divulgação do vosso trabalho nesses dois hemisférios?
AJ – Quando se fala em projecção internacional estamos a competir com os grandes, logo, é muito difícil ao estarmos na gaveta dos independentes. Ainda assim conseguimos grandes reviews e estamos a vender bastante música, mais internacionalmente do que cá. Estamos distribuídos não só no CD físico como na colocação das músicas no iTunes. É, para nós, já uma grande mostra de valor por parte das pessoas que apreciam, compram e consomem. Temos outras ideias para aplicar internacionalmente, designadamente os concertos. Os concertos são a grande vaga. Os discos são cada vez mais o cartão de visita para mostrarmos a música; porém, na minha opinião, os concertos é que são a mais valia das bandas. Ao invés, pode tornar-se na grande extinção, pois pode ser feito um grande trabalho em estúdio e, subsequentemente, não se conseguir representar ao vivo. Estamos muito satisfeitos com o que está a acontecer internacionalmente e estamos a trabalhar nesse sentido. Em Portugal, não se está a vender. Continuamos a ter bastantes spots, bastante solicitação e temos em perspectiva o novo disco. Vamos ver o que é que vai acontecer.

A – E para quando o próximo disco?
AJ – Se calhar para o final do próximo ano. Tenho um projecto novo, um projecto em português, do qual o Bruno também faz parte, mais mainstream que, entretanto, se vai interpelar na carreira dos Blunder. Os Blunder vão ter que, de certa forma, hibernar, enquanto o outro projecto é instalado.

Passagem “Morangos”

“Ajudou-nos muito. Deu-nos bastantes concertos e as pessoas conhecem o tema. Temos a percepção de que algumas pessoas conhecem os Blunder exactamente por esta nova vaga”.

A – Em relação à vossa música ser inserida também nos “Morangos com Açúcar” como é que se procedeu a essa inserção?
AJ – Por vários contactos. O tema tinha a ver com a temática daquela série, o que fez com que o interesse deles fosse quase imediato. Ouviram o tema quiseram fazer a inserção na série. Estamos a falar de uma faixa que não consome Blunder, mas que conhece os Blunder através da compilação “Morangos com Açúcar” ou da série Foi bastante positivo.

Palco a palco

“De festivais, queimas das fitas, dos concertos dos grandes palcos, se calhar, o concerto das Noites Ritual 2004, no Porto, tenha sido o mais memorável. Muita gente esteve presente, foi um grande concerto e funcionou muito bem”.

A – Qual o palco que gostariam de pisar?
AJ – No que diz respeito a palcos internacionais bastantes constariam da eleição. Há muitas salas míticas em Inglaterra. Não estou a falar de grandes palcos, mas de salas. No nosso país também há muitos espaços emblemáticos, como Aula Magna, Casa da Música e Coliseus.

A – Com que banda a dividir o palco?
AJ – Com uma banda internacional. Escandinava, sueca, … os Editors, Bloc Party, entre outros.

Trabalho mediatizado

“O nosso trabalho já contou com determinado número de acções com os media”.

A – O vosso trabalho já percorreu os media. Com certeza já tiveste que responder a diversas perguntas, mas há uma pergunta que gostavas que te tivesse sido feita?
AJ – Não, penso que não. Eu nunca falei sobre o meu passado musical e, como gosto, até oriento nesse direcção algumas respostas. Sou consumidor de música, compro muitos discos e tenho verdadeiras relíquias no baú. Constam no meu repertório pessoas que estão no panorama com quem já toquei; não obstante, estive inserido em distintos projectos de blue, jazz e experimental. Considero que é isso que complementa o músico.

A – E quais foram as outras bandas que não deixam de fazer parte do teu percurso musical?
AJ – Muitos projectos. Estive na formação embrionária dos Ornatos Violeta, por exemplo, ainda antes do Manuel Cruz. A posteriori, estive envolvido em projectos com o João André, baixista do Abrunhosa. Nunca aconteceu nada. Os projectos nunca tiveram nada editado, foram projectos que não passaram da garagem.

A “Promessa” do amanhã

“O que acontece é que as pessoas querem aparecer no panorama para gravar discos e ter logo exposição. Isso é um processo que, às vezes, demora tempo e que as pessoas têm de saber equacionar e avaliar”.

A – Falamos de bandas, qual o conselho para as novas bandas que estão a surgir?
T – Paciência. As coisas não acontecem imediatamente. É muito importante perceber que se, às vezes, as coisas não estão num patamar é por que a qualidade ainda não é a suficiente para estar lá. Os projectos levam tempo a amadurecer e é importante que as pessoas tenham noção disso e que se deixem levar. Pisem palcos e que façam muitos espectáculos e muitos ensaios, de modo a que se sintam confiantes no que estão a dar. É necessário, inclusive, que tenham pessoas a darem bons indicadores. Apreciadores e bons formadores de opinião que saibam dizer se a banda está bem ou se precisa de algo mais, mas com bom sentido de oportunidade. Estar cinco anos na sala de ensaios e, só ao fim desse tempo sair, é tempo a mais. Há uma linha muito ténue entre o que é o suficiente e o que é o importante e o aceitável.

Com mais um aniversário a chegar, desta vez na consecução um patamar que não é atingido por muitas bandas, os Blunder deixaram no sítio do MySpace a nota de que uma grande surpresa está a ser preparada para o próximo ano: “há a ideia de editar um DVD, com imagens raras, com videoclips, com tudo. Esse, se calhar, é o grande projecto para o ano para os Blunder”, revela o vocalista da banda.
Relativamente a prospectivas, os Blunder não querem ansiar nada “nem queremos estar a equacionar ter grandes vendas e grandes fãs. Queremos é continuar a subsistir, a fazer música cada vez mais de acordo com as nossas convicções”, afirma AJ. Os Blunder assume que é música que gostam de fazer e confessam que se sentem “completamente entregues ao fazermos a música que sentimos e que gostamos de acordo com aquilo que ouvimos”. É isso que tentam passar para os discos e, especialmente para os concertos, onde tocam ao vivo.
Com uma vincada independência face ao mundo da música, a banda assegura, pela voz de AJ que “antes de pensarmos no público, que é muito importante, pensamos em nós. Se gostamos realmente de tocar e fazer aquilo que fazemos”.
Os Blunder evidenciam a garra de uma banda que marca o panorama da música nacional, ainda que cada etapa continue a ser como “um começo” no qual persiste o “caminhar através da chuva”.


Anabela da Silva Maganinho

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