Sunday, June 10, 2007

O segredo nos relvados


João Pereira, actual jogador do Gil Vicente, encontra-se com situação indefinida, devido a novos interessados que vão surgindo, no mercado das contratações, dia-após-dia.
Iniciou a sua carreira, no futebol profissional, ao serviço do SL Benfica, o clube que ainda hoje está muito presente.
Aos seis anos e meio, suscitou no jogador o gosto pela bola e, por isso, pediu aos pais para o colocarem num clube. Os pais atenderam prontamente à solicitação. Domingos Sávia, clube das imediações, recebeu João aos sete anos (apenas com esta idade poderiam ser inscritos).
Dois anos depois, João começava a dar os primeiros passos rumo ao mundo do futebol quando ingressa na equipa do Benfica. Obviamente que este principiar do seu percurso até ao futebol sénior se processou por etapas que foram formando o jogador que presentemente encontramos determinado pelos relvados. O camisola 47 relembra que “Para mim, naquela altura, era um hobbie. Era o que eu gostava de fazer, o que me dava mais alegrias”.
Embora o pai seja adepto do outro clube da segunda circular – o Sporting – nunca colocou quaisquer entraves às opções clubísticas de João. Aliás, tanto ele como a restante família sempre o apoiaram e deslocavam-se, inclusive, até onde quer que ele estivesse.
Subsequentemente à conclusão do curso do 12º ano, João Pereira candidatou-se ao Ensino Superior; contudo, não foi sobre a continuação do curso de Desporto que a sua escolha recaíu. Optou por seguir pelo futebol profissional que era a sua verdadeira paixão “Já tinha o exame de Biologia marcado, tinha tido explicações antes e desisti à última da hora. Talvez naquele ano, aquando do término do curso, em que iria entrar e não entrei, a minha mãe tenha ficado um pouco triste, mas agora já esta mentalizada”.
A conquista no escalão sénior tinha-o deixado “sonhar” pelos estádios e, por consequência, o futebol não poderia ser colocado como segunda opção. O seu palmarés foi acolhendo o somatório de vitórias e conquistas durante a caminhada em que envergou a «camisola vermelha e branca»
Porém, as vicissitudes despoletaram na sua saída do clube da Luz. O Gil Vicente gostou da atitude afirmada do jogador em campo e, a título de empréstimo remunerado pelo Benfica, recebeu João Pereira e João Vilela. Os atletas mostraram a sua eficiência e eficácia e, no final da época, assinaram um vínculo contratual por três épocas.

Um início de época controverso assombrou o Gil Vicente com o caso Mateus. A polémica instala-se e deixa em aberto a permanência ou exclusão do clube de Barcelos das competições nacionais. Numa primeira instância, foi decretada a suspensão do clube das competições nacionais, tendo a situação sido contornada pela descida para a Liga de Honra. Ainda com o caso por resolver, lutava-se pela manutenção na BWin, mas já nada havia a fazer.

Anabela (A) – Com toda a confusão instaurada entre Gil Vicente e Belenenses pensou, porventura, abandonar o clube?
João Pereira (JP) – Quando a polémica se instaurou eu só queria ir embora. Todavia, tinha um contrato assinado e a responsabilidade de o cumprir. Restou-me ficar e ainda tenho mais dois anos de contrato. Vamos ver o que acontece.

A – O que reconhece que poderia ter acontecido se não tivesses optado pela vinda para o Gil Vicente na época passada?
JP – Não sei. Hoje com o que se está a suceder no Benfica poderia ter a possibilidade de jogar alguns jogos. Não digo que me teria afirmado, mas estaria a jogar. Não estou arrependido de ter vindo para o Gil Vicente, estou contrito é de ter chegado e deparar-me com o incidente do caso Mateus. Se não fosse isso estaria a jogar na primeira liga e não depositaria muita atenção no resto. Na primeira jornada deste campeonato, o Gil deslocava-se a Lisboa para o encontro com o Benfica e eu estava super contente. Já pensava em entrar na «Luz» e dar o máximo para ganhar ao Benfica, porque tinha de defender o clube que represento. Após o caso Mateus tudo se processou ao contrário e foi aí que suscitou em mim a frustração por estar na segunda divisão, sabendo que poderia estar na primeira.

A – Há quem aborde a vinda para o Gil Vicente como um decréscimo na carreira. Considera acertada essa observação?
JP – Toda a gente pensa assim. Eu estava no Benfica, na luta constante pelo título, e venho para o Gil Vicente, uma equipa que é despromovida para a liga de honra e tem por objectivo não descer. Mas prefiro dar um passo atrás e ter a oportunidade de dar dois para a frente, do que permanecer no Benfica a correr à volta do campo e regredir. Não fui o primeiro jogador a fazer isto nem hei-de ser o último. Perante isto, o que tenho de fazer é nunca baixar a cabeça e acreditar que é possível chegar lá novamente.

Não perdurou em João Pereira qualquer sentimento de indignação ou frustração. “Se calhar fiquei um pouco triste, porque foram 13 anos naquele clube”, assevera João, e explica “no Benfica, ganhei alguns títulos – fui Campeão, ganhei a Taça de Portugal e a Supertaça – e, posteriormente, chega um treinador novo e diz que não conta comigo”.
Ainda assim assume que é ao Benfica que deve “aquilo que sou hoje” e, para não estar a importunar, “decidi prosseguir com a minha carreira, não descartando a possibilidade de um dia voltar àquela casa”.
Para João Pereira, o Benfica significa o concretizar de um sonho. “A partir de determinada altura, nos juvenis com cerca de 16 anos, comecei a ver que poderia chegar à equipa sénior do Benfica. Encetou-se em mim o sonho de vir a jogar naquele Estádio (antigo Estádio da Luz), com milhares de pessoas a observarem”, confessa o jogador. “Já na altura em que era apanha bolas e via todas aquelas pessoas no estádio, achava fantástico. Imaginava-me, então, um dia ali a perfilar no meio campo, antes do apito do árbitro”.
Estreou-se no Estádio do Bessa e, aquando da entrada em campo, “tremia por todo o lado”. “Naqueles instantes, acho que toda a minha carreira me passou pela cabeça”, foram anos naqueles trinta segundos que o acercaram por completo. Porém, depois de estar lá dentro “abstraímo-nos de tudo e apenas nos concentramos no futebol”.
Mas o Gil Vicente é o clube cujas cores representa e que o tem feito aprender e crescer. Em primeira instância, “fez-me aprender a dar valor àquilo que eu tinha no Benfica. Eu estive lá e nem sempre dei o devido valor ao que tinha conseguido. Agora ao ser jogador do Gil Vicente, dou imensa importância a tudo. Este ano no Gil evoluí muito”. João Pereira expõe que o Benfica está sempre a atacar, poucos eram os jogos que defendiam. Ao invés, no Gil, “os jogos são mais «taco-a- taco» localizando-se mais a defesa no jogo”.
Os jogadores, defensivamente, precisam de ter adversários de qualidade para evoluírem. É este o primórdio pelo qual o jogador se conduz. “Na época passada, jogamos contra o Porto e contra o Sporting e evidenciou-se muita qualidade. E sempre me disseram “se queres ser bom treina com os melhores”.


A – Não sentiu que a contratação do Nelson poderia afectar a sua permanência na posição?
JP – Não posso dizer que foi a chegada do Nelson. O Miguel é um dos melhores laterais direitos e eu jogava com ele. Fazíamos bons jogos e dávamo-nos muito bem. A posteriori, o Nelson juntou-se ao grupo. Era um jogador que estava em forma e os treinadores apostaram nele e penso que fizeram bem. Apenas acato as decisões dos treinadores e sempre dei tudo ao serviço do clube. Só por isso sinto-me feliz.

A – Há uma imagem que destaco. A Final da Taça de Portugal em que o Benfica vence a partida frente ao FC Porto, no Jamor. João e Simão sobem a escadaria, tal como a restante equipa, para receber a Taça e, assim que a têm nas mãos, começam com os cânticos a festejar a vitória.
JP – Nesse encontro não joguei, ainda que tenha realizado jogos anteriores. Todavia, para a maior parte das pessoas que viram – eu próprio depois vi na televisão – puderam presenciar a alegria com que eu estava a festejar mesmo não tendo jogado. Pelo Benfica podia estar uma época inteira no banco e somente jogar de vez em quando, que no final da época eu iria festejar com os meus colegas como se do primeiro título da minha vida se tratasse. Jogar naquele clube é um sonho e se acrescermos ao facto de conseguirmos ganhar títulos com aquela massa associativa é o êxtase. Estava nas nuvens. Fiquei triste no ano seguinte, ganhamos o campeonato, mas perdemos a taça e ainda custou mais perder do que ganhar.

Esta época, durante o período de abertura de mercado, emergiu uma proposta contratual do clube espanhol Málaga. Ainda que se encontre, de momento, na segunda Liga, o Málaga captou a atenção de João e iniciou-se o processo de transferência. De acordo com o jogador a proposta do Málaga teve quase certa. Contudo, não se concretizou “Estava para ir para lá, mas os papéis chegaram tarde à Federação Espanhola”. “Na altura fiquei um pouco triste, porque não tem nada a ver o futebol espanhol com o futebol português”, revela João.
Actualmente, até fica feliz por não ter assinado pelo Málaga e ter continuado no Gil Vicente “é que tenho alguns clubes para onde posso ir assim como algumas portas abertas”.

As referências circunscrevem a sua trajectória profissional desde os primórdios. O primeiro jogador que se revelou um ídolo foi o Ronaldo. Não obstante, na sua posição “gostava imenso do romeno Petresco, do espanhol Michel Salgado e do Contra”.
Nos últimos tempos, “o futebol tem vindo a evoluir muito e novos jogadores são descobertos”. A sua predilecção vai para Xavier Zanetti, jogador ao serviço do Inter de Milão, e Miguel, que agora representa o Valência.


A – Em todo o percurso teve e continua a ter referências. O que significa tornar-se uma referência para os mais novos?
JP – É sempre bom termos pessoas que digam que gostariam de ser como nós. É um orgulho que me deixa deveras contente. Por outro lado, pode tornar-se complicado. Se ninguém nos conhecer podemos ir na rua e fazer o que quisermos sem que nos apontem nada; em contrapartida, enquanto figuras públicas, estaremos sempre com o pé atrás e com o pensamento em se deveremos ou não realizar determinada acção.

João Pereira avoca a sua preferência em alinhar a lateral “se bem que me divirto muito a jogar a extremo, porque tenho menos responsabilidades defensivas e posso perder mais vezes a bola”. O maior defeito é ser “muito impulsivo e, por vezes, enervo-me muito facilmente”, emite o atleta.

A – Ao entrar em campo denota-se uma personalidade vincada e um certo ar intempestivo. Considera que há quem subestime o seu valor tirando elações incorrectas, uma vez que a sociedade cria estereótipos, designadamente pela postura que tem ou pelo visual que adopta?
JP – Eu creio que sim. Acredito que, enquanto estive no Benfica, algumas pessoas não gostavam de mim por causa disso. Muitas pessoas pensam que me tornei assim por ter chegado ao Benfica, especialmente por ter conquistado lugar nos seniores. Está errado quem me vê dessa forma, pois já desde os miúdos que sou assim com todos. Daí afirmo que apenas os meus pais e os pais dos meus colegas, que me acompanharam ao longo dos escalões jovens do Benfica, é que me conhecem e sabem que essa atitude é mesmo minha e instintiva, independentemente do clube que represento. Vou ser sempre assim.

A – Considera que o futebol passa por ser uma imagem de marca?
JP – Pode ser. O futebol hoje em dia é mundial. As pessoas de todo o mundo vêem futebol, porque adoram o futebol e, inclusive, pagam para nos verem a jogar. Nesta sequência, as empresas querem estar ligadas a este desporto. Pensam em dispor as suas marcas na camisola de determinado clube e sabem que essa forma de promoção terá impacto. As pessoas vão visualizar e reconhecer a marca em outras circunstâncias.

A – Preocupa-se muito com a imagem? Acha-la um factor determinante na carreira de um jogador?
JP – Sem dúvida. Há muitos jogadores que, hoje, não precisavam dos salários pagos pelos clubes para se conseguirem sustentar. As marcas e os patrocínios conseguem perfeitamente fazê-lo. Temos os casos evidentes do Beckham ou do Ronaldinho Gaúcho que dão a imagem pelas grandes marcas, pelo que a imagem deles vende muito. Cada dia que passa, um jogador que apareça, que seja um bom jogador e que tenha uma multidão atrás de si conta com a aposta das várias empresas que detectam ali um expoente de atracção.


Um jogador para ser bem sucedido deve ser, “acima de tudo, humilde. Não obstante, deve reconhecer as suas capacidades e limitações”. João Pereira atenta no facto de que “um jogador não deve querer ir mais além dos seus limites. Há que ter em conta que muitos jogadores têm verdadeiras qualidades que prevêem um grande futuro; contudo, se não tiverem a «cabeça assente» nada conseguirão. O inverso são aqueles jogadores que até nem têm grandes qualidades técnicas nem muitos atributos, mas que colocam a cabeça para pensar e se regem segundo regras adquiridas e conseguem ir longe”.
Além disso, o jogador deve ser equilibrado para conseguir aceitar certas decisões, tais como sucessivos jogos no banco de suplentes ou uma substituição aos 89minutos.

JP – Muitos jogadores dizem que anseiam vir a representar o Benfica, nem que seja apenas para estar no banco, eu inclusive já o disse. Chegamos ao Benfica e já nos sentimos de certa forma realizados. Contudo, os jogadores, uns mais do que outros, são ambiciosos e chegar ao Benfica não chega, tem que se jogar no Benfica. E falo no Benfica por experiência, mas o mesmo se processa no Porto, no Sporting ou em qualquer outro clube. Estive lá e, estar 90 minutos, todos os jogos, sentados no banco a vermos os outros a jogar e não podermos fazer aquilo que mais queremos e mais gostamos, é complicado. Sei que ia, por vezes, ao banco todo o jogo e vinha desiludido comigo próprio. Tentava pensar no que poderia fazer mais, obter soluções para contornar a situação e jogar. Ficar esporadicamente não tem qualquer problema se for em prol da equipa, agora ver os jogos do banco sistematicamente não é fácil. Pior só mesmo não ser convocado.

A – Após esta época já decorrida, toda ela ao serviço do Gil Vicente, que balanço pode ser feito?
JP – Depois de toda a controvérsia com que nos deparamos e de tudo pelo qual os jogadores passaram penso que acabou por ser uma época extremamente positiva. Desde a pré-temporada que não realizamos, porque não sabíamos se iríamos jogar nem tão pouco se o Gil Vicente iria persistir. Neste momento, estamos com dois meses de salários em atraso e andamos na constante indefinição. Não obstante, a meio da época posicionarmo-nos no meio da tabela e começarmos a pensar na subida quando, de repente, nos tiram nove pontos que apenas nos fazem pensar em não descer. Com tudo isto penso que fizemos um campeonato extraordinariamente regular e se não fossem aqueles nove pontos, acrescido aos três jogos que não disputamos, poderíamos lutar pela subida.

A - Qual a opinião que emite acerca de Paulo Alves?
JP – Eu só tenho a dizer bem do Paulo Alves. A situação dele este ano também não foi fácil. Que incentivo aos jogadores pode dar um treinador que não sabe qual é o destino do clube? Este foi o primeiro ano que efectivou como treinador. Na época anterior tinha sido o nosso Director Desportivo e, normalmente, a relação entre jogadores e Director Desportivo é muito aberta, quase como se de um colega se tratasse. O Paulo Alves começou a treinar-nos e, na fase inicial, era difícil - tanto para nós como para ele - delimitar as fronteiras da confiança. Ainda assim, conseguiu incutir-nos a vontade de vencer perante tudo o que estávamos a viver e, também por essa razão, considero que ele teve um papel fundamental na nossa época.

João Pereira elege José António Camacho como melhor treinador “Ele tratava todos os jogadores de igual modo: podia ser a maior estrela do mundo que ele trataria da mesma forma que me tratou a mim, um miúdo quando fui para a equipa. Era uma pessoa que percebia muito de futebol”.
No que concerne a clubes de futebol nutre grande apreço pelo Benfica, em Portugal. No futebol estrangeiro, “usualmente temos um clube por cada país. Em Espanha, o Barcelona desde a época do Ronaldo e, em Inglaterra, o Manchester United”, declara.
Poder um dia representar estes clubes “seria um sonho”. No Benfica já jogou e “foi através desse clube que tive a possibilidade de jogar no Estádio do Manchester United”, o que se traduz num marco da sua carreira.
Foi o Benfica o clube que lhe concedeu, graças ao seu esforço, a oportunidade de estar presente nas competições internacionais e afigurar Portugal além fronteiras.

A – Está integrado em competições nacionais e internacionais pela Selecção Nacional. Qual a discrepância existente entre as competições europeias e as competições a nível nacional?
JP – Quando representamos o país, ao sermos convocados, é para estarmos ao lado dos melhores. Poder ser considerado dos melhores é uma alegria enorme. O futebol é diferente, o espectáculo é melhor pois há mais qualidades. Ao nível interno, juntam-se as equipas grandes, por exemplo o Benfica, um dos melhores clubes; e, quando jogam contra clubes mais pequenos, se calhar já não há aquela qualidade nem há o jogo disputado. Enquanto que nas Selecções Nacionais há sempre a vontade de querer ganhar por parte de ambas as equipas, visando mostrarem qual é a melhor.

A – Recorde a sua estreia nas competições europeias.
JP – A primeira vez que participei a sério numa competição internacional foi com o Benfica na Taça UEFA. Perdemos com a equipa que se sagrou campeã com o Sporting na final, o CSKA de Moscovo. Na Selecção, a primeira grande prova foi o Europeu de Sub-19, ficamos em segundo lugar porque perdemos com a Itália na final. Dois/Três anos mais tarde tive o Europeu de Sub-21 no qual ficamos no terceiro lugar e voltamos a perder com a Itália. No último Europeu não participei e agora só espero ser convocado para este que irá decorrer.

A – Sente saudades em representar o seu clube na Liga dos Campeões e na UEFA?
JP – Sim. Muito mais da Liga dos Campeões em que os Estádios estão sempre cheios. Ouvir o hino no princípio do jogo até arrepia e é uma sensação muito agradável.

Marcar um golo é um feito que traz aos jogadores, mais que não seja satisfação por contribuir directamente para o contador. Não é tão significativo qual a competição a ser disputada, porque o golo é sempre uma concretização e “alegria”. Ao nível das competições europeias “só marquei na Taça UEFA, o que não tem o mesmo significado que marcar na Liga dos Campeões. Para mim fazer um golo, independentemente da competição em causa, é o momento mais bonito num jogo de futebol: ver as redes a abanar com a entrada da bola lá dentro. É um momento fantástico e indescritível o sentimento”.
O «sonho comanda a vida» e João não lhes é indiferente, embora esteja consciente da realidade e de que só com esforço consegue alcançar o que pretende. “O meu maior sonho é ser feliz. Profissionalmente o que espero é voltar aos grandes palcos e, a curto prazo, ser campeão europeu”, patenteia.


A – A Selecção A é uma dessas metas a atingir?
JP – Mais tarde. Neste momento, estou preocupado com a Selecção Sub-21 com quem tenho mais um ano. Não penso na Selecção A, pelo menos enquanto estiver no Gil Vicente. É muito difícil um jogador que esteja na Liga de Honra ser convocado para a Selecção A. Julgo que só quando estiver num grande clube, que me dê a oportunidade de mostrar o meu valor é que poderei estar na Selecção A.

A – Não considera que o público atenta muito mais sobre a selecção A do que pela de esperanças?
JP – Não sei. Sempre que joguei com os Sub-21, em Portugal, notei a diferença que em Lisboa sempre pouca gente vai ver os jogos, mas no Norte os Estádios estavam completamente esgotados. Presenciamos isso no Europeu, mesmo que através da Televisão. No entanto, se perguntarmos às pessoas se preferem ver o Cristiano Ronaldo ou o Ruben Amorim, por exemplo, a escolha é óbvia. Na Selecção Sub-21 temos grandes jogadores; mas é na Selecção A que estão os grandes craques. É normal e eu compreendo isso perfeitamente.

O Euro 2007 aproxima-se. Já no próximo mês irá ser disputado pelos jogadores que ainda aguardam pela convocatória de José Couceiro. Questionado acerca das expectativas para o Campeonato Europeu, João Pereira confessa que não gosta muito de falar nisso e expele as razões: “no ano passado estava com muitas expectativas e acabei por não ser convocado. Foi essa a minha grande frustração nestes anos todos de futebol. Fiz os jogos todos de apuramento, alcançamos em todos as vitórias e, aquando de ir realmente desfrutar da prova decorrida em Portugal, não pude participar. Foi uma desilusão não ter ido ao outro europeu e este ano nem quero pensar nisso”.
Uma circunstância ainda hoje por explicar não só a João como ao público que assistiu a todo o apuramento e Euro. As dúvidas não foram esclarecidas pelo que mesmo o jogador menciona, já conformado, ainda não ter compreendido a razão pela qual não foi convocado. “Quem fez as escolhas fê-las. Ficou provado que não fez as escolhas acertadas, mas se as coisas tivessem corrido bem ninguém se ia lembrar que não me tinha convocado a mim e a outros jogadores”.

A - Qual considera que será a selecção mais forte na competição?
JP – A Selecção de Portugal é muito forte, mas a Selecção mais forte de sempre é o Brasil. Têm jogadores para formarem duas ou três selecções de grande qualidade.

A – E no desafio dos Sub-21?
JP – Sinceramente não conheço as Selecções dos Sub-21, porque este ano o apuramento foi muito curto. Enquanto no ano passado realizamos doze jogos este ano apenas quatro foram disputados. No estágio haveremos de ver vídeos das outras equipas. Qualquer equipa que esteja lá tem de ter valor, uma vez que eliminou outras equipas.

Simão Sabrosa, jogador do SL Benfica, é o jogador que fica na memória de João. “Jogava na equipa B do Benfica e, às vezes, realizávamos treinos com a equipa principal. Eu alinhava como defesa, o Simão como extremo esquerdo e não nos dávamos muito bem. Sempre pensei que ele era um pouco arrogante – que talvez seja a imagem que transparece – e eu tinha essa ideia pré-definida. Quando comecei a jogar com ele inverti a minha opinião”. Fundamenta a sua nomeação dizendo que “é um grande amigo, um grande profissional que sempre me ajudou”. Mas este não é o único jogador que destaca. Ricardo Rocha, Nuno Assis, Miguel e Tiago foram jogadores que o surpreenderam muito. “Eu tinha a percepção, porventura semelhante à daqueles que estão do lado de fora, de que os jogadores profissionais só ganhavam dinheiro, não ligavam aos outros e que o egocentrismo era predominante como se o mundo girasse à volta deles. Isso não é verdade, pois são pessoas cinco estrelas, na sua maioria pessoas normais”.

Repartido entre Lisboa e Barcelos, tenta conciliar a vida profissional com a vida afectiva. Portanto, nem sempre é tarefa fácil “foi extremamente complicado. O que me ajudou a superar essa fase foi o facto de ter vindo com o João Vilela, que conheço há muito tempo, e partilharmos a residência. Se viesse sozinho não sei como iria aguentar”.
Quando estava em Lisboa não parava em casa. Lá tinha os amigos, nasceu e foi nessa cidade criado, “tudo o que gosto está em Lisboa”. Em Barcelos, “no princípio foi difícil”. Terra nova, costumes diferentes, não contava com a presença física dos seus amigos nem sequer da família. “Estranhei a temperatura que se fazia sentir, não conhecia ninguém e tinha de tratar de tudo, inclusive tarefas domésticas”. “Agarrei-me mais à playstation e ao computador que acabaram por ser, se assim podemos dizer, os meus melhores amigos”, confessa João. Só pensava “o que é que estou aqui a fazer?!”, mas, de imediato, ocorria-lhe o quão boa poderia ser a experiência. Sabia que ia fazê-lo crescer “quer ao nível profissional – pois evoluí no Gil Vicente – quer ao pessoal uma vez que se aprende muito ao viver sozinho e a ter responsabilidades” e foi isso que lhe deu força para prosseguir. “Este ano já foi mais fácil porque já conheço o local e mais pessoas”.
O jogador de futebol não tem uma vida fácil, contrariamente ao que se possa pensar. Os jogos que não correm bem, a constante luta pela vitória, a pressão, não obstante, a toda a componente pessoal que envolve todo o seu humano. É frustrante – e as pessoas nem sempre se apercebem – “estar dentro de campo e não conseguir fazer o que ambiciona e fazer bem”, uma vez que todos temos dias bons e dias maus.

A – Não raras vezes, torna-se complicado lidar com determinadas situações? Os jornalistas colaboram com o desconforto?
JP – Na minha opinião, um jornalista é um «pau de dois bicos». Quando um jogador está bem é posto no topo, ao invés, de quando as coisas não correm tão bem e os mesmos são colocados em baixo. O jogador tem de saber de lidar com isso: não se embandeirar quando faz a primeira página, nem baixar a cabeça quando o jornalista os coloca em baixo. Os jornalistas fazem o trabalho deles - e não estou aqui para os criticar até porque não sei o que é que eles têm de escrever -, mas sei que há apreciações que eles fazem e que são completamente injustas. O jogador só tem de se abster disso e fazer o trabalho dele.

A – Como foi “vestir” a pele de jornalista e realizar uma mini-entrevista ao João Vilela?
JP – Foi no estágio de pré-época. Eu estou sempre na brincadeira e aquele foi mais um momento em que tal se proporcionou. Quem não me conhece pensa que sou arrogante, irreverente ou outra coisa qualquer, mas eu estou é sempre na brincadeira. Aquele foi só um desses momentos, mas nunca pensei ser jornalista. Não quero vir a ser jornalista, foi somente um momento engraçado.

A – Qual foi a situação mais difícil de aceitar ou ultrapassar?
JP – Quando ganhamos a Taça de Portugal. A situação mais difícil foi a de ver o Féher. Ele não faleceu em campo, mas, foi em campo que, praticamente, se deu a morte dele. Em Maio, foi a vez do meu amigo Bruno Baião. Acho que esse foi o ano mais difícil e foi a maior dificuldade que tive de ultrapassar.

Considera-se reconhecido pelo trabalho que tem vindo a efectuar, apesar da sua carreira não contar com uma longevidade colossal. “Quando vou na rua as pessoas conhecem-me e ainda dizem que eu devia estar no Benfica. É um motivo de orgulho andar na rua e as pessoas saberem quem eu sou e pedirem autógrafos”, profere João.
O jogo da sua vida pode ser considerado no Estádio do Bessa pelo que este Estádio “estreei-me e fui, mais tarde, campeão nacional. Funciona como uma espécie de amuleto”.
As expectativas que alumiam o caminho que percorre são, neste momento a ambição de “chegar ao topo”. Não esconde, novamente, o “grande objectivo de jogar em Inglaterra, na Premier League, quem sabe no Manchester United”. Qualquer clube no campeonato inglês seria “uma realização para João, pois “adoro aquele futebol onde prevalece o imenso respeito nas diversas relações. Não há insultos como se vê em Portugal, nem tantas polémicas”. Fascinam-no os estádios repletos a cada jogo, não sendo relevante os clubes em questão, mas o espectáculo. Qualquer clube pode conceder esse anseio, mesmo o que se encontra no último lugar da classificação, “com um grande ambiente e o futebol é mais pacífico”. Evidenciando a sua precedência, manifesta o desejo e vontade por ingressar num campeonato onde “Aí é que me ia sentir bem”.
E é por que estamos a falar de um jogador arrojado e determinado pela conquista, que o devemos apoiar a cada jornada do seu campeonato.


Anabela da Silva Maganinho

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