Tuesday, February 1, 2011

SEGUNDA-FEIRA, 5 DE JULHO DE 2010

Klepht: Os guerreiros do combate pela música

Os Klepht estiveram este fim-de-semana no Porto a promover o mais recente álbum “Hipocondria”. Nos showcases realizados lembraram os momentos que revestiram este novo registo e aproveitaram para interagir com o público da Invicta.

“Tudo de novo” é o single que já integra a playlist das grandes estações radiofónicas nacionais assim como outrora fizeram parte “Por uma noite” e “Embora doa”. Estes foram duas faixas do álbum de estreia da banda de Lisboa formada por Diogo Dias, Francisco Duarte, Filipe Contente, Marco Reis e Mário Sousa.

Tudo começou no ano de 1996, quando Diogo e Francisco decidiram entrar num concurso da escola com alguns originais. Ainda um pouco distante, o projecto Klepht começaria a dar os primeiros passos por estes dois membros e, passados quatro anos, mais três elementos já tinham aderido à boa maneira de se fazer música. Divulgar a música que iam fazendo a amigos e conhecidos acabou por levar o som Klepht pelo país e com o incentivo de todos um outro passo foi dado: a gravação do primeiro álbum. Oito anos foram precisos para colocar o disco ao dispor de todos, mas o trabalho foi recompensado e, hoje, já se vêm com o segundo álbum e pensam já no terceiro.

Em entrevista, Diogo Dias revelou-nos um pouco da vida profissional, enquanto VJ e músico, e até nos mostrou um pouco de si próprio pela maneira como, neste momento, encara a vida.


O início

Quando começamos nunca tivemos expectativas de gravar um disco. Nunca tocamos covers, só originais, sempre na perspectiva de mostrar aos amigos. Estávamos ali por gozo. A partir do momento em que começamos a ter, realmente, da parte dos nossos amigos e das pessoas que nos iam ouvindo o feedback que deveríamos gravar decidimos, então, começar a levar a coisa mais a sério.

Anabela (A) – Vamos começar pelo início dos Klepht. Sabemos que é uma banda formada em Lisboa, mas como se procedeu a inclusão de todos os membros?

Diogo (D) – Nós existimos, já desde 2000, com esta formação. Na altura, tínhamos de escolher um nome para a banda e isso é sempre algo complicado. “Como é que vamos chamar e qual é o significado que o nome tem que ter para a banda?” Não nos lembramos mesmo como é que a palavra Klepht surgiu, mas achamos piada ao significado. Os klepht eram uma espécie de guerrilha na época em que o Império Automano, no século XV, invadiu a Grécia. Um grupo de gregos, que eram os klepht, permaneceram independentes nas montanhas da Grécia e lutaram contra os Turcos para manterem a independência da Grécia. Achamos piada ao facto de eles serem de guerrilha e de lutarem contra o sistema. Porquê? Porque andamos anos oito anos para gravar o primeiro álbum, que saiu em 2008. Gastamos dinheiro do nosso próprio bolso e andamos a tocar em bares de Norte a Sul do país a ver se as pessoas gostavam da nossa música ou não.

A – Relativamente à vossa formação, vocês já eram amigos antes deste projecto?

D – A questão é essa nós surgimos a partir das amizades. Formei a banda em 1996, altura em que eu e o Francisco, um dos guitarristas, decidimos participar num concurso da escola. O prémio era um telemóvel, o dito calhamaço, e acabamos por ganhar. Eu já compunha, em casa, mas foi aí que fizemos a nossa primeira música. Na altura não era Klepht até porque ainda surgiram uns três ou quatro nomes. Com a ida para a faculdade conheci o Filipe que tinha vivido a vida toda em Montegordo e era amigo do Marco. Começamos a conviver com ele e convidámo-lo a ir aos ensaios. O Mário, quase vizinho do Marco, passou a integrar a banda também e foi aí que se formou o núcleo duro.

A – Alguma vez pensaram que iriam conseguir ficar juntos tanto tempo?

D – Costumo dizer que a banda é como uma relação. Tu nunca sabes se é para durar muito ou se é para durar pouco. É claro que tem que haver um compromisso. Somos cinco pessoas com gostos totalmente diferentes, com personalidades muito distintas e é isso que faz a sonoridade da banda ser o que é. Nos Klepht funcionamos como uma anarquia saudável, na qual toda a gente tem que estar de acordo. A partir do momento em que os cinco estejam de acordo está tudo bem. O problema é que muitas vezes para isso acontecer temos de estar todas à chapada uns com os outros. (risos)

A – Sentem que há muita gente que ouve a vossa música, mas não associa à banda Klepht?

D – Sim. No primeiro álbum, quisemos que as pessoas começassem a conhecer o som antes de conhecerem, realmente, a banda. Queríamos que só depois fossem tomando conhecimento acerca das pessoas que estavam por detrás daquela música. Penso que nisso tivemos sucesso, porque a música, como passou muito na rádio, acaba por estar no ouvido daqueles que vão aos concertos. O que acontece muito hoje em dia é que começamos um concerto e as pessoas não fazem a mínima ideia de quem nós somos e quando começamos a cantar “Por uma noite” ou “Embora doa” as pessoas associam. É curioso. Neste segundo álbum, estamos a tentar explorar um pouco mais a imagem para que as pessoas comecem a associar a música a uma imagem e a uma banda.


O palco

Nós fazemos um som rock/pop. As músicas dos Klepht surgem através de pequenas malhas. No início dos ensaios, costumamos fazer jam sessions: cada um começa a tocar o seu instrumento e, de repente, há um que se junta a outro e os outros vão todos atrás e, a partir daí, vai-se formando uma música … começa por aí e cada um tem as suas referências.

A – Quais são as principais referências que influenciam na vossa música?

D – Cada um tem as suas referências. Se fores a minha casa ou se fores a casa do Marco, provavelmente, os cds que vais encontrar são completamente diferentes. Ando a ouvir um tipo de música que se colocar para o Francisco ouvir ele vai-me insultar e dizer que estou maluco, porque aquilo não é música. Portanto, é difícil dizer que tipo de som é que fazemos. É um pop/rock desde a geração Pearl Jam que, para mim, é, extremamente, marcante. Considero que ogrunch nos influencia um pouco. Bandas como Muse, ou desde U2 a Coldplay, é óbvio que nos influenciam. No entanto, se ouvires o nosso álbum não faz muito sentido detectares as referências, porque ouvindo o álbum, do início ao fim, percorremos tudo e tentamos diversificar ao máximo.

A – Há alguma banda com quem vocês gostassem de pisar o palco, actuar lado-a-lado ou fazer a primeira parte?

D – Vou falar por mim. Pearl Jam foi a banda de referência. Tenho irmãos mais velhos e andei muito na fase dos Guns ‘n’ roses e dos Queen. Quando apareceram os Pearl Jam e eu ouvi pela primeira vez o “Even Flow”, Alive Pearl Jam, tive de comprar. Foi o primeiro CD que comprei na vida com o meu próprio dinheiro. Não aguentei. Ouvi aquilo pela primeira vez e entrou-me tão bem, fez-me tanto sentido… só tinha onze anos e disse: pronto é isto. A partir daí acompanhei a carreira toda dos Pearl Jam. Para mim, eles são os reis da geração em que cresci pela forma de estarem na música. Para além de Pearl Jam, tenho mil e uma bandas com quem gostaria de tocar, fazer parcerias ou, simplesmente, pisar o palco por onde eles pisaram.

A – Vais estar lado a lado com eles no Optimus Alive?

D – Quando entrei na MTV disse: “só vou entrar na MTV por um motivo que é um dia hei-de entrevistar o Eddie Vedder”. Curiosamente, os Pearl Jam não têm um corte de relações com a MTV, mas não falam a quase meios de comunicação nenhuns. Então, sempre que ele vem cá nunca consigo estar ao pé dele, porém, este ano, vou estar ao pé dele. Sei, exactamente, onde é que ele vai surfar e eu vou estar lá a surfar com ele. (risos)


A idade social

Queremos fazer o nosso percurso gradualmente.

Faço música, mas não faço música de intervenção. Não chega só fazer música de intervenção, tem de ser tudo uma acção social. Acho que está toda a gente adormecida e acomodada ao consumismo, e por aí fora, e não querem saber de mais nada. Portanto, penso que nós fazemos parte da idade da estupidez, sem sombra de dúvida.

A – Relativamente a concertos, qual foi o mais memorável? Os fãs têm-vos acompanhado ao longo de todos estes anos? Vocês interagem muito através das plataformas online, mas sentem que há fãs que vos acompanham?

D – Há, sem dúvida e é surreal ver isso. Uma coisa é seres fã de uma banda, outra coisa é teres pessoas que gostam da tua música e que a acompanham. Nas Fnacs, aqui no Porto, é impressionante. Há muitas pessoas que estiveram nas outras Fnacs e estão, também hoje, aqui connosco. Pessoas que nos acompanham desde o primeiro álbum. Aliás, a maior parte das pessoas vêm com o novo álbum dizem “eu tenho o primeiro” e “gosto mais deste ou não gosto mais deste”. É essa interacção, hoje em dia, que a internet possibilita. Permite estarmos mais próximos das pessoas e, por isso, tentamos desenvolver ao máximo, se bem que nem sempre é possível. No entanto, tentamos acompanhar as pessoas e tentamos saber as suas opiniões. O concerto mais memorável? Temos vários já. A queima das fitas do Porto foi a loucura. Abrimos Xutos e Pontapés, só por aí já é o que é, e depois estavam à volta de 50 mil pessoas. Foi muito bom mesmo e as pessoas reagiram muito bem ao concerto. Ainda no ano passado tivemos um ENEE (Encontro Nacional de Estudantes de Enfermagem). Estavam muitas pessoas, mas em comparação com a queima das fitas do porto não teve nada a ver. Só que estava tudo doido. Não sei o que é que se passou, mas, naquele dia, as pessoas estavam todas malucas. Pela primeira vez, teve que vir o segurança agarrar em mim para me libertar, porque ninguém me largava ali à frente. A loucura mesmo.

A – Consideram que estão na “idade da estupidez” ou encaram a vida com “calma”?

D – O significado da “idade da estupidez” (sexto tema do álbum) não é uma geração. É o estado actual da sociedade. Penso que estamos a viver a idade da estupidez, porque ninguém se revolta com nada. Toda a gente sabe das coisas que estão a acontecer. Hoje em dia, tudo é público e, mesmo assim, as pessoas deixam as coisas andar. Penso que, mais tarde ou mais cedo, isto tem que mudar, senão, sinceramente, não sei onde é que isto vai parar. Estamos a atravessar uma fase da vida. Ao nível musical estamos bem. Somos mais maduros do que éramos no primeiro álbum. Estamos sem editora e, por isso, andamos a fazer tudo. É bastante mais trabalhoso, mas torna-se prazeroso quando obtemos o resultado final. Sinto-me numa fase muito calma da minha vida. Sinto-me um pouco triste por não fazer coisas que já deveria ter feito, todavia, tenho perspectivas de as fazer a todas mesmo que seja tarde e a más horas.


A”Hipocondria”: novo álbum, a solução

Estamos a ultrapassar esses medos e estamos aqui para mostrar a nossahipocondria. Não podes agradar toda a gente. Tens é de fazer o teu trabalho e de te sentir bem.

A – Há algumas palavras que possam descrever este vosso segundo álbum de forma a servir de apresentação para quem não o tem?

D – Este álbum foi muito diferente do primeiro. Enquanto no primeiro álbum tivemos as músicas durante cinco anos, para este álbum compusemos as 14 músicas em apenas dois meses, nos Estados Unidos. É um álbum talvez mais coeso e mais uniforme. Fomos gravar com uma produtora que já tinha gravado com bandas de muito peso, pois também nós queríamos pesar o som dos Klepht. Ficamos contentes com o álbum de estreia, mas queríamos ter dado um toque mais agressivo, que não conseguimos passar. A hipocondria são os medos que surgem na nossa cabeça. Durante a gravação do álbum, muitas vezes, duvidas da tua capacidade. Surgem dúvidas sobre as músicas – se são capazes de resultar ou não – e é ultrapassares esse medo. Então, a hipocondria não é no mau sentido, mas sim no bom sentido. Estamos a ultrapassar esses medos e estamos aqui para mostrar a nossa hipocondria. Em qualquer tipo de arte, as pessoas têm medo de ser avaliadas quando o que é bonito é mostrares o que gostas de fazer. Há pessoas que vão gostar e há pessoas que não vão gostar. É como o Bill Cosby diz: o segredo do sucesso não sei qual é, o do insucesso é quereres agradar toda a gente. Não podes agradar toda a gente. Tens é de fazer o teu trabalho e de te sentir bem.

A – No que concerne ao teu trabalho para além da banda. Trabalhas na MTV e ficas irritado se alguém te pergunta algo que tem que ver com a MTV? Vejo em muitas entrevistas esse estabelecimento de relação.

D – Não me irrita, só porque percebo perfeitamente. (risos) Como também tenho de fazer entrevistas sei perfeitamente que há certo tipo de perguntas que têm de ser feitas. O que nós não queríamos era que as pessoas associassem à banda o facilitismo da MTV e, por isso, não mostramos a cara no primeiro álbum. Já existíamos antes da MTV, já tínhamos tido contratos discográficos antes da MTV. A MTV deu-nos imensos contactos, deu-nos imensos conhecimentos. Entramos mais facilmente no meio a partir do momento em que acabo por estar no meio. Por outro lado, e porque temos um país com muito má língua e língua afiada, é mais fácil as pessoas apontarem o dedo. É curioso que, ainda hoje, as pessoas chegam-se ao pé de mim e perguntam quem é que faz as músicas e quem é que escreve. Somos nós. Nós não somos um produto fabricado. Somos altamente genuínos. Devo muito à MTV, mas os Klepht são uma coisa completamente à parte e acho que o mérito que a banda tem é totalmente a partir das músicas e não da MTV.

A – No CDgo.com está escrito que vocês são considerados uma banda com pop/rock quase perfeito, com canções de formação ideal para rádio. Concordas com esta afirmação?

D – No primeiro álbum fomos trabalhar com o Mário Barreiros, um dos melhores produtores portugueses. No primeiro álbum, ensinou-nos muitas coisas acerca daquilo que é a estrutura perfeita. No segundo, nós não pensamos em nada. Nos Estados Unidos, a Sylvia Massy tinha um conceito completamente diferente de tudo, então, fizemos as músicas despejadas mesmo. No entanto, há uma coisa que fazemos questão: como somos cinco e temos gostos diferentes, ou os cinco estamos completamente de acordo com cada parte da música ou então a música não passa. Somos muito auto-críticos e temos a perfeita noção de que fazemos músicas que são catching. A pessoa pode não gostar logo à primeira, mas se ouvir três ou quatro vezes e gostar daquele tipo de som, provavelmente, vai gostar. Não é nada premeditado. Da mesma maneira que ouves música e gostas de ouvir esta ou aquela música, quando pegas numa viola aquilo que vais tocar é o que gostas de ouvir. E é isso que nós fazemos.

Os Klepht direccionam-se para aquilo que gostam, sem terem a obrigação de agradar. Querem continuar a dar boa música e a proporcionar bons momentos aos que os rodeiam.

Em Portugal, o único problema é que existem poucos espaços para tocar: “temos cada vez mais bandas a fazerem música com muita qualidade e diversificada. Há espaço para toda a gente, não existem sítios para tocar”. Diogo Dias esclarece que “o público português tem de perceber, de uma vez por todas, que tem que apoiar a música nacional. Temos excelentes músicos e vale a pena mesmo”.



Anabela da Silva Maganinho

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